quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Golpe: não há outro nome para o ocorrido em Honduras


Fui provocado, em uma caixinha de comentários de um blog por aí, a rebater um a um os argumentos do articulista de Veja, Reinaldo Azevedo, defendendo o golpe de estado ocorrido em Honduras. Em seguida, mais um comentarista saudoso da ditadura correu em linkar um artigo de Dalmo Dallari, onde este pretende encontrar na constituição Hondurenha os dispositivos que “legalizariam” o golpe.

Primeiramente, quero deixar claro que não sou jurista, e portanto, não tenho arcabouço teórico para um debate dessa natureza. Logo, procurei fontes onde me amparar. Nesta procura, acumulei elementos que permitem encontrar onde reside a ilegalidade do golpe.

Se o tão citado artigo 374 da Carta Magna hondurenha efetivamente impossibilita reforma constitucional que altere o mandato presidencial ou possibilite a reeleição do titular do respectivo mandato, este artigo não gera a perda de mandato pelo presidente da República, e muito menos dispensa o devido processo legal para tal sanção. Tal item destina-se a punir conduta que proponha recondução presidente e não a mudança do dispositivo para futuros governantes.

O plebiscito proposto por Zelaya, contra o qual se levantaram parlamentares e juízes, previa uma consulta popular sobre se a aceitação de um novo plebiscito, juntamente à eleição geral de novembro, prevendo a instalação de uma assembléia constituinte, que iniciaria seus trabalhos após o final do mandato do presidente Zelaya. Portanto, poderia estabelecer ou não a reeleição para o seu sucessor, e não para ele próprio.

Mesmo assim, outros aspectos da constituição hondurenha foram sumariamente solapados, entre eles garantia do amplo direito de defesa, e do devido processo legal. A Constituição de Honduras, como qualquer Constituição democrática do mundo, reconhece o direito de defesa e o devido processo legal em diversos de seus dispositivos, dentre outros, seus artigos 82, 89, 90, 94 e 95.

Por fim, o artigo 102 da Constituição hondurenha estabelece expressamente que nenhum hondurenho poderá ser expatriado nem entregue pelas autoridades a um Estado estrangeiro. O seu artigo 85 determina ainda que nenhuma pessoa pode ser detida ou presa se não nos lugares determinados pela lei.

Além disso, a expulsão inviabiliza fisicamente o exercício do direito de defesa por Zelaya e a realização do devido processo legal. Desmascara-se assim a verdadeira intenção golpista: depor o presidente por ato violento, sem qualquer processo ou possibilidade de exercício do direito de defesa.

Finalmente, a conduta golpista, além de se basear em um bocado de inconstitucionalidades, constitui crime conforme o disposto no artigo 2º da Carta hondurenha, que tipifica como delito de traição da pátria a usurpação da soberania popular e dos poderes constituídos.

Pior do que isso, é querer justificar a conduta golpista por ter apoio da justiça do país. Às Cortes constitucionais cabe o papel de interpretar a Constituição e não de usurpá-la às abertas. Cabe-lhes defendê-la, não destruí-la. Um Judiciário republicano e democrático, obviamente, não deve exercer a jurisdição de forma imperial, criando normas constitucionais e impondo-as sob o título de interpretar normas vigentes. A isso se chama claramente de golpe de estado.

Segundo o artigo 3ª da Constituição de Honduras: “artigo 3º - Ninguém deve obediência a um governo usurpador, nem a quem assuma funções ou empregos públicos por força das armas ou usando meios ou procedimentos que quebrem ou desconheçam o que esta Constituição e as leis estabelecem. Os atos praticados por tais autoridades são nulos, o povo tem o direito a recorrer à insurreição em defesa da ordem constitucional”.

Logo, o levante popular contra o golpe é legítimo, e lícito. Criminosos são aqueles que, ao arrepio da lei, pretendem impor uma ordem arbitrária, anti-democrática, ilegal e autoritária. Reconhecer Zelaya como presidente legítimo de Honduras e exigir sua imediata recondução ao poder e a punição de todos os golpistas não se trata de uma atitude de esquerdistas, ou Chavistas, mas sim de verdadeiros defensores da ordem internacional e da soberania do povo hondurenho.

2 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom Levi, agora ficou mais claro ainda que a deposição do Presidente Manoel ZelaYa, além de imoral é ilegal!

Anônimo disse...

Parabéns!

Aqui vai versão extensa de parecer juridico quanto ao Golpe publicada recentemente,que faz referencia a jurista hondurenho,vale a pena ler:



http://ultimainstancia.uol.com.br/colunas_ver.php?idConteudo=63469